quinta-feira, 19 de junho de 2014

Perturbação Autística

     As características essenciais da Perturbação Autística são a presença de um desenvolvimento acentuadamente anormal ou deficitário da interação e comunicação social e um repertório acentuadamente restritivo de actividades e interesses. As manifestações desta perturbação variam muito em função do nível de desenvolvimento e da idade cronológica do sujeito.
     O défice na interação social recíproca é importante e persistente. Pode existir um acentuado défice no uso de múltiplos comportamento não verbais (tais como contacto ocular, expressão facial, postura corporal e gestos) reguladores da interação social.
Pode existir incapacidade para desenvolver relações com os companheiros, adequadas ao nível de desenvolvimento. Esta incapacidade pode assumir diferentes formas em diferentes idades. Os sujeitos mais jovens podem ter pouco ou nenhum interesse em estabelecer amizades. Os mais velhos podem ter interesse na amizade mas falta-lhes a compreensão das convenções de interação social. Pode verificar-se uma ausência de tendência espontânea para partilhar com os outros prazeres, interesses ou objetivos (por exemplo, não mostrar, trazer ou indicar objetos de interesse). A falta de reciprocidade social ou emocional pode também estar presente (por exemplo, não participando ativamente em brincadeiras sociais simples ou jogos, preferindo atividades solitárias ou envolvendo outros em atividades unicamente como instrumentos ou ajudas «mecânicas»). Muitas vezes, a consciência que o sujeito tem dos outros é extremamente deficitária. Os sujeitos com esta perturbação podem prescindir das outras crianças (incluindo os irmãos), podem não ter a noção das necessidades dos outros ou não perceber o mal-estar nas outras pessoas.
     O défice na comunicação é também acentuado e persistente e atinge tanto as aptidões verbais como as não verbais. Pode produzir-se um atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem oral. Nos sujeitos que falam pode observar-se uma acentuada incapacidade na competência para iniciar ou manter uma conversação com os outros ou um uso estereotipado ou repetitivo da linguagem ou uma linguagem idiossincrática. Também se observa uma ausência de jogo realista espontâneo, variado, ou de jogo social imitativo adequado ao nível de desenvolvimento. Quando se desenvolve a fala, o volume, a entoação, a velocidade, o ritmo ou a acentuação podem ser anormais (por exemplo, o tom de voz pode ser monótono ou conter elevações interrogativas no fim das frases). As estruturas gramaticais são muitas vezes imaturas e incluem o uso de uma linguagem estereotipada e repetitiva (por exemplo, repetição de palavras ou frases sem entender o seu significado, repetição de rimas ou de anúncios comerciais) ou uma linguagem metafórica (isto é, uma linguagem que só pode ser claramente compreendida pelos que conhecem o estilo pessoal de comunicação do sujeito). A compreensão da linguagem está muitas vezes atrasada, e o indivíduo pode ser incapaz de compreender perguntas simples ou instruções. A perturbação da pragmática (uso social) da palavra é muitas vezes evidenciada pela incapacidade para integrar palavras e gestos, ou para compreender os aspetos humorísticos ou não literais do discurso, tais como a ironia ou os significados implícitos. O jogo imaginativo pode estar ausente ou ser acentuadamente deficitário. Estes indivíduos têm tendência para não se envolverem nos jogos simples da imitação ou rotinas infantis próprias da primeira ou segunda infâncias, ou se o fazem é fora do contexto ou de uma forma mecânica.
     Os sujeitos com Perturbação Autística têm padrões de comportamento, interesses e atividades restritos, repetitivos e estereotipados. Podem ter uma preocupação absorvente por um ou mais padrões estereotipados e restritivos de interesses que resultam anormais, quer na intensidade quer no objetivo; ou uma adesão, aparentemente inflexível, a rotinas ou rituais específicos, não funcionais; maneirismos motores estereotipados e repetitivos; ou uma preocupação persistente com partes de objetos. Os sujeitos com Perturbação Autística revelam uma acentuada restrição na variedade de interesses e preocupação com um único interesse muito limitado (por exemplo, interessados apenas em datas, números de telefone e nomes de emissoras radiofónicas). Podem alinhar um número exato de peças de jogo sempre e sempre da mesma maneira ou reproduzir repetidamente comportamentos de um ator de televisão. Podem insistir na identidade ou uniformidade das coisas e mostrar resistência ou mal-estar devido a mudanças triviais (por exemplo, uma criança muito jovem pode ter uma reação catastrófica à mais pequena mudança no meio, como uma mudança na posição do mobiliário ou o uso de novos talheres à mesa). Há frequentemente um interesse por rotinas ou rituais não funcionais ou uma insistência irracional em seguir determinadas rotinas (por exemplo, seguir todos os dias exatamente o mesmo percurso para ir à escola). Os movimentos corporais estereotipados incluem os que são feitos com as mãos (bater palmas, estalar os dedos) ou todo o corpo (balançar-se, inclinar-se, mexer-se). Podem estar presentes anomalias posturais (por exemplo, andar na ponta dos pés, movimentos estranhos das mãos e posturas corporais estranhas).
     Estes sujeitos revelam uma preocupação persistente por certas partes dos objetos (botões, partes do corpo). Também podem ficar fascinados por movimentos (por exemplo, o girar das rodas de um carro, o abrir e fechar de uma porta, um ventilador elétrico ou qualquer objeto que gire rapidamente). Podem ficar intensamente ligados a um objeto inanimado (por exemplo, um pedaço de fio ou um bocado de borracha).

Almeida, J.N. (2002) DSM - IV - TR. Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais. Lisboa: Climepsi Editores

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